Qual é o papel da Prefeitura de Bauru no enfrentamento da letalidade policial?

A letalidade policial tem aumentado significativamente no Estado de São Paulo desde o ano de 2023, com o início do governo Tarcísio de Freitas.

Um levantamento do Instituto Sou da Paz, com base em dados da Secretaria de Segurança Pública, apontou que houve, em todo o Estado, um aumento de 78% de letalidade policial em serviço de janeiro a agosto deste ano em comparação com o mesmo período em 2023.

Gráfico do Instituto Sou da Paz feito com base nos dados da Secretaria de Segurança Pública

Na região das cidades do entorno de Bauru, o cenário se repete. De janeiro a agosto de 2024, 13 pessoas morreram por policiais em serviço, o que representa um aumento de 225% em relação ao mesmo período de 2023. 

O último caso que ficou conhecido em Bauru foi dos jovens Guilherme Alves Marques de Oliveira, de 18 anos, e Luís Silvestre da Silva Neto, de 21, que foram mortos por agentes do 13º Batalhão de Ações Especiais de Polícia (BAEP), no Jardim Vitória, na última quinta-feira, dia 17. Segundo o Boletim de Ocorrência, os policiais envolvidos na ação efetuaram 27 disparos de fuzil contra os jovens.

No dia seguinte, outros policiais do BAEP invadiram o velório do jovem Guilherme, agrediram familiares e amigos, inclusive a mãe Nilceia Rodrigues, e prenderam um dos irmãos do morto por desacato. Em um dos vídeos que circulou pelas redes sociais, é possível ver os policiais agredindo a família ao lado do corpo sendo velado.

A pesquisa mostra que jovens negros são as maiores vítimas das polícias, já que 64,2% das pessoas mortas de janeiro a agosto deste ano são negros, enquanto as vítimas brancas foram 31,3%. Em 2024, o percentual de vítimas negras na letalidade policial alcançou seu maior patamar nos últimos seis anos.

A vereadora Estela Almagro (PT), presidente da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara Municipal de Bauru, defende que a segurança pública não deve ficar à cargo somente do governo do Estado, quem comanda a Polícia Militar. A Prefeitura de Bauru também tem o seu papel. 

“O município, a partir dessa mobilização que nós estamos fazendo, tem a sua parte e nós vamos cobrar. Porque esses meninos estão se entregando para a dependência do tráfico ou para a utilização do tráfico e outros crimes como meio de sobrevivência, inclusive por uma omissão governamental. Porque na medida em que você tem governos coerentes, competentes, engajados com a sua população, com a obrigação de levar esporte, de levar cultura, de levar entretenimento, de levar formação profissional, de garantir escola boa, de qualidade, isso tudo, quando não existe, essa exclusão leva esses jovens para o tráfico, para a droga e para o crime também. É automático? Não, mas é estatístico. […]  A prefeita não pode assistir o que está acontecendo e não ter uma posição, inclusive por ser uma mulher de origem humilde e preta. Estes jovens são maciçamente periféricos, pretos, filhos de famílias excluídas”, disse a vereadora. 

Após o caso no Jardim Vitória, o Conselho Municipal dos Direitos Humanos de Bauru informou, através de uma publicação nas redes sociais, que está levantando mais casos de letalidade policial ocorridos nas periferias de Bauru. A advogada Taylise Zagatto, presidente do colegiado, informou que um comitê sobre violência policial foi criado para ouvir denúncias de qualquer abuso de autoridade. 

“Eu tenho recebido muitas denúncias. Estou tentando seguir essa agenda, de conversar com instituições, montar uma rede que seja efetiva de proteção para essa população, porque o Conselho não quer colocar ninguém em risco com essas denúncias. E, ontem [23/10], tive uma reunião com o ouvidor das polícias aqui do Estado de São Paulo, conversamos diretamente sobre criar um protocolo para atendimento dessas famílias, [para] que elas estejam protegidas, caso elas queiram denunciar qualquer tipo de abuso de autoridade. Também estou procurando outras instituições, a Defensoria Pública, o Ministério Público, quem possa me auxiliar nas oitivas dessas denúncias”, contou Zagatto.

A advogada defende que a Prefeitura de Bauru deve buscar o contato direto com as forças militares sobre os procedimentos que têm sido adotados nas periferias quanto à segurança pública: “o que eu visualizo é que muitas vezes a Prefeitura também tem endossado esse discurso violento que está ocorrendo no Governo do Estado de São Paulo. Isso é preocupante, porque diante de toda essa violência que está acontecendo aqui na nossa cidade, e fui informada pelo ouvidor que a nossa situação é preocupante, a Prefeitura deveria tentar esse diálogo direto com as forças militares para verificar o que está acontecendo, qual o procedimento está sendo seguido, o que está acontecendo nos bairros e nas comunidades mais periféricas aqui da nossa cidade, Porque quem está morrendo não é a comunidade aqui do [Jardim] Estoril, quem está morrendo é a população preta, pobre, periférica das comunidades mais marginalizadas aqui da cidade”.